Laços do Luar - Um novo mundo - Capítulo 8

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O Retorno

 

Charlotte me usou de manequim a tarde inteira. Fui alfinetado, medido e consultado sobre os estilos de roupa inúmeras vezes. Por fim, saímos de lá com seis novas peças feitas exclusivamente para mim e para Liz.

O Sol já estava se pondo. Charlotte nos acompanhou até a carruagem.

— Espero que possam vir mais vezes. E, James, minha cabeça está a mil com várias ideias, graças a você. — Falou entusiasmada — Essa noite vou tentar pôr elas em prática, sinto que poderei contar a sua ajuda.

— Claro, hehehe — Falei sem jeito, não queria ser espetado tão cedo de novo, mas não podia ser ingrato com alguém que fez roupas novas para mim.

— Liz, tome cuidado. Já fazem duas semanas que as estradas estão estranhas — O tom dela foi mudando aos poucos.

— Algumas pessoas relataram sentir presenças sombrias os perseguindo — Elas se entreolharam tensas, com certeza tentavam não falar demais devido a minha presença, mas aquelas poucas palavras eram o bastante para se entenderem.

— Já tomei as devidas providências. — Respondeu Liz — Ou você acha que eu vim aqui apenas pelas roupas? — Sorriu toda travessa.

Entramos na carruagem e seguimos de volta para o palácio.

Olhando com atenção, pude observar mais daquela cidade e sua população. As ruas eram de pedra trabalhada como as de Londres no fim do século dezenove. Os vários postes espalhados pelas ruas começaram a se acender sozinhos, um a um, como se respondessem a um comando silencioso do próprio mundo.

— Como essas luzes acendem sozinhas? — perguntei, curioso.

— Elas são alimentadas pelas magículas — respondeu Liz casualmente, ajeitando a franja sobre o chifre. — Pequenas partículas de energia que escapam da Tapeçaria. Estão em tudo: no ar, na terra… em mim e você.

— Em mim? Mesmo não sendo daqui? — perguntei surpreso.

Liz parou de arrumar a franja e me olhou, finalmente me dando total atenção.

— Sendo sincera, não sei se posso afirmar com certeza, mas nada  e nem ninguém,  nunca viveu desconectado da Tapeçaria. É algo impossível.

Ela fez uma pose pensativa com a mão no queixo, estilo “O pensador”, e começou a murmurar algumas coisas sozinha.

Muitos dos edifícios eram de madeira ou tijolos, alguns cobertos por trepadeiras e detalhes metálicos ornamentais. A maioria das pessoas usava roupas muito parecidas com as da época vitoriana.

As mulheres usavam vestidos com saias longas de babados, bolsinhas de mão combinando e chapéus grandes extremamente detalhados e dos mais diversos tamanhos.

Os homens usavam camisas de manga comprida com colete de botões, alguns com cartolas, outros com bengalas estilizadas.

A carruagem serpenteava entre as ruas revelando lojas, mercados e farmácias a cada nova esquina.

— Vamos lá, me diga o que se passa nessa sua cabecinha! — Disse Liz enquanto olhava minha notável confusão.

— Sinceramente? Quanto mais eu vejo, mais confuso fico — murmurei, enquanto observava uma máquina semelhante a um bonde se mover sozinha pelas trilhas de pedra com pequenos feixes de luz azul emanando da base.

— Esse mundo… ele parece com o meu em alguns aspectos, mas é como se várias épocas diferentes estivessem presas “no mesmo tear”. — Ri sem graça da comparação.

— Uma bela analogia, senhor Drumont — comentou Liz com leveza. — Às vezes, “a beleza da Tapeçaria está no equilíbrio dos fios”. Nem tudo precisa seguir a mesma linha pra funcionar.

— E como vocês geram energia? Isso tudo é… mágico? Ou é tecnologia mesmo? Aquela coisa de voar, por exemplo… — perguntei, curioso.

— Boa pergunta — Liz endireitou-se no assento, olhando para o céu que começava a escurecer. — A maior parte da nossa energia vem das linhas de soma, partículas que flutuam entre os fios da Tapeçaria. Tudo isso é possível graças à interação entre o Tear presente nos seres vivos e a própria Tapeçaria.

— Tapeçaria, Tear, soma… Por que será que acho que não estamos falando das mesmas coisas? — murmurei, coçando a cabeça, confuso.

Liz riu da minha confusão, se divertindo às minhas custas. Mas, apesar disso, suas provocações não me incomodavam; até achava graça no sorriso dela.

— Bem, não sou uma boa professora, mas, sendo direta, imagine o mundo como uma grande tapeçaria, tecido pela deusa mãe a partir de seus próprios cabelos. É nela que se entrelaçam todas as formas de vida e energia.

— O Tear nunca dorme, mesmo quando os olhos fecham — continuou — e todo ser vivo está conectado a ele, que por sua vez está ligado à Tapeçaria. Todos estamos interligados de certa forma com a energia do mundo e do universo. Entende?

Assenti, mas minha expressão denunciava o contrário. Então decidi perguntar:

— Então, Liz, o que exatamente é esse tal Tear? É uma ferramenta? Um objeto?

— Não, James. O Tear não é algo que você pode pegar ou ver. É um espaço dentro de você, um núcleo onde a energia da soma flui, se concentra e se tece. Pense nele como uma bola de linha girando dentro do seu corpo.

— Uma bola de linha? — estranhei.

— Exatamente. Essa energia — a soma — passa por você, pelo Tear, e é dessa tecelagem interna que as forças do mundo são moldadas e liberadas. O Tear está ligado à sua essência, ao seu núcleo somático. Não é uma ferramenta externa, mas parte de você.

— Então eu sou o tecelão e o Tear é o espaço onde eu crio essa tecelagem?

— Isso mesmo. E a Tapeçaria é o tecido que todos criamos juntos — o universo inteiro entrelaçado — mas cada Tear é o ponto onde você começa a trabalhar essa energia.

— Alguns se especializaram em manipular essa energia — explicou Liz — são os tecelões, aqueles que trabalham diretamente com os fios do Tear. Charlotte é uma das mais habilidosas do reino, e sua criatividade ilimitada foi fundamental para chegar onde está.

— E qualquer um pode ser um tecelão?

— Nem todos. Na verdade, o termo “tecelão” tem mais de um significado, dependendo do contexto. O mais comum se refere aos estudiosos da soma, um cargo geralmente ocupado pelos Lanianos, já que somos mais sensíveis a essa energia.

— Além disso, existem aqueles que utilizam armas e acessórios para manipular as magículas, usando essa energia de formas variadas, tanto em batalhas quanto na criação de artefatos.

— Se quiser se aprofundar, pode consultar a biblioteca do palácio ou tirar suas dúvidas diretamente com a Charlotte.

— Pode apostar que vou fazer isso — respondi, animado.

Depois de um tempo, a carruagem entrou em um bosque. Liz parecia um pouco tensa, ela fitava a escuridão pela janela, murmurando algo para si mesma.

Já nas entranhas do bosque, a carruagem começou a tremer um pouco. Inicialmente achei que deveriam ser buracos na estrada, mas, logo me recordei que mais cedo quando passávamos por esse mesmo local não havia buracos por aqui. Eu estava com um mal pressentimento.

— O que está acontecendo?

— Não se preocupe, James, tenho tudo sobre controle. — Liz me respondeu sem tirar os olhos da janela.

Comecei a suar frio, os murmúrios de Liz começaram a ficar cada vez mais altos até se transformarem em palavras. Algo estava muito errado. Me aproximei da janela para tentar ver o que se passava lá fora.

— NÃO OLHE! — Elizabeth me empurrou de volta para o assento.

Mas já era tarde. Pude ver uma miríade de espectros negros rodeando a carruagem. Eles me encararam e logo enlouqueceram. Tentaram avançar em minha direção, mas logo bateram em uma barreira dourada de pura luz.

— Luz ancestral que varre as trevas… — O corpo de Liz ficou envolto por uma energia dourada, —Brilhe! Queime e ilumine! Faça as trevas se dobrarem em desespero. Sexagésima  Benção: Domo dourado!

A energia se expandiu iluminando todo o bosque. Os espectros se contorciam e gritavam em desespero ao serem tocados pela luz. Muitos se desintegraram e alguns poucos se dissiparam. Liz estava suada e visivelmente cansada, ela olhou rapidamente em volta em busca de possíveis inimigos e logo depois veio verificar se eu estava bem.

— Você está bem? — Seu olhar era duro, mas preocupado — Algum deles lhe viu ou tocou? Vamos responda.

— Bem… Eu acredito que si… Arhg! — Gritei.

Um zumbido crescia dentro da minha mente. Segurei a cabeça com ambas as mãos. Minha visão estava escurecendo, podia sentir como se minha mente estivesse sendo puxada para outro lugar.

— JAMES!! JAMES!! Aguente firme. Cocheiro, mais rápido! — os Chicotes estalavam incessantemente e os cavalos relinchavam em resposta. — Aguente rapaz, aguente! — Ela pôs suas mãos em volta de minha cabeça e logo uma luz dourada brotou de entre seus dedos.

A luz era reconfortante e estranhamente familiar. A voz de Liz foi ficando cada vez mais distante até desaparecer.

Os instantes seguintes foram de pura confusão, várias imagens surgiam em minha frente como um rolo de filme. Alguns eram de minha antiga vida no meu mundo, outras de pessoas que eu nunca vi, e em seguida apenas a escuridão.

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